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Flip começa nesta quarta com homenagem a Euclides da Cunha

A Festa Literária apresenta temas de Os sertões vistos por olhos contemporâneos

Euclides da Cunha vai ser homenageado na Flip deste ano (Foto: Reprodução)

Quando escolheu Euclides da Cunha como homenageado da 17ª edição da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), a curadora Fernanda Diamant pensou não só no caráter fundador de uma ideia de Brasil trazida pelo trabalho do autor, mas também na junção de lados opostos. Ela lembra que tanto a esquerda quanto a direita se apropriaram de Euclides e sua obra, o que permite sublimar ideologias quando se trata de Os sertões. É, portanto, com esse tom político espalhado por todas as 21 mesas propostas na programação que a Flip tem início hoje, com uma abertura tocada pela historiadora Walnice Nogueira Galvão e um espetáculo dirigido por Camila Mota, do Teatro Oficina. “Ele tem um ponto de vista muito fundador do Brasil e que é anterior a toda discussão política atual, mas toca em todos os pontos que a gente precisa discutir”, garante Fernanda.

Camila Mota apresenta uma montagem feita a partir da encenação de Os sertões, criada por José Celso Martinez Corrêa em 2000, enquanto a crítica literária Walnice Nogueira Galvão fica encarregada de dar uma aula sobre Euclides. Professora emérita da Universidade de São Paulo (USP) e autora de No calor da hora: a guerra de Canudos nos jornais, reeditado este ano pelo Cepe, Euclidiana: ensaios sobre Euclides da Cunha, Walnice ensina que Os sertões ajuda a entender o Brasil. Foi, segundo ela, o primeiro livro a falar de genocídio no país e tem uma atualidade considerável. “Fala do Brasil de agora”, garante a pesquisadora. Ela sugere uma leitura apaixonada do relato de Euclides, com disposição para se deixar levar pela linguagem. “Não é uma linguagem de todo dia, mas que corresponde a monstruosidade que ele está relatando. Ele não pode relatar um genocídio com linguagem qualquer. Na descrição dele, até a natureza está abalada pela monstruosidade. A terra está em revolução, as plantas também, tudo concorre para a grande tragédia”, analisa.

Leitura contemporânea

 

Entre os 23 convidados desta edição, todos trazem, de alguma forma, um tema euclidiano na fala e na escrita. “Acho que o Euclides abre um guarda-chuva enorme, porque fala de vários assuntos, da violência da terra, toca em pontos ambientais, fala de queimada, da ciência do período, que era bastante preconceituosa”, explica Fernanda. “A ideia é fazer uma leitura dele através dos convidados, que eles o atualizem e tratem contemporaneamente de vários temas nos quais ele toca em outros períodos da história.” Se convidados como Walnice e o português Miguel Gomes estão diretamente envolvidos com o autor e Os sertões — ela com pesquisa, ele em processo de filmagem da versão cinematográfica do livro —, há uma série de outros cuja ligação não é necessariamente explícita.

Jarid Arraes vem do Ceará com uma escrita que mistura o mundo pop contemporâneo e as referências tradicionais da região do Cariri, onde cresceu. Seu Redemoinho em dia quente é uma coletânea de contos aos quais nada escapa. O carioca Miguel del Castillo mergulha em cenário turístico para revirá-lo e falar das desigualdades inevitáveis na América Latina em Cancún e a venezuelana Karina Sainz Borgo tem a Venezuela decadente pós-Chávez como pano de fundo para o best-seller Noite em Caracas, editado em 22 países. “Karina fala da Venezuela e Miguel, de um menino que tem uma relação complicada com o Rio de Janeiro e encontra refúgio em grupo de jovens da igreja evangélica. Então, também tem uma relação com Canudos por esse viés de Antônio Conselheiro” avisa a curadora, que também trouxe Ailton Krenak para as discussões. “Euclides também foi para Amazônia, e Ailton é um cara que pensa a cultura indígena, entende das cosmologias indígenas, é um pesquisador e um intelectual.”

A África vista sob uma ótica contemporânea e local estará nas falas do franco-ruandense Gaël Faye, do angolano Kalaf Epalanga e de Ayòbámi Adébáyò, considerada a nova Chimamanda Adichie da literatura nigeriana. Em Meu pequeno país, Faye fala de uma infância abortada pelo genocídio de Ruanda e Adébáyò transita entre a tradição e a emancipação feminina em Fique comigo.

 

Meio ambiente e ciência são temas políticos no cenário brasileiro de 2019. Em tempos de seguidores de seitas que proclamam a terra plana, cientistas como o neurocientista Sidarta Ribeiro e jornalistas como o americano David Wallace-Wells e a brasileira Cristina Serra abordam preocupações concretas e urgentes. Aquecimento global está na pauta de Wallace-Wells, editor da New York Magazine e autor de A terra inabitável. Já Cristina se debruça sobre capítulo recente da história brasileira em Tragédia em Mariana: a história do maior desastre ambiental do Brasil.

E a neurociência no meio disso? Bem, estudar os sonhos pode ser um caminho para compreender melhor a humanidade e Sidarta Ribeiro, fundador do Instituto do Cérebro da Universidade Federal de Natal, mostra isso em O oráculo da noite, belíssimo livro sobre a história e a ciência do mundo onírico. A lista de convidados tem ainda nomes como o da americana Kristen Roupenian, autora do mais esperado que celebrado Cat Person, e os brasileiros Bráulio Tavares, Marilene Felinto, Marcelo D’Salete, Ava Rocha, Amir Klynk e Adriana Calcanhoto.

 

 

 

17ª Festa Literária Internacional de Paraty (Flip)

De hoje a domingo, no Auditório da Praça Matriz de Paraty

 

 

 

 

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