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BNDES quer dividir risco de socorro a grandes empresas com outros bancos

Banco público busca outras instituições para financiar setores em dificuldades, como o de aviação, e minimizar críticas

BNDES: banco quer ajudar mais companhias sem elevar o volume de recursos públicos na ação (Nacho Doce/Reuters)

Incumbido da tarefa de socorrer empresas em dificuldades com a crise do coronavírus, o BNDES concluiu que não fará isso sozinho. O banco de fomento decidiu dividir o risco das operações com outras instituições, credores e acionistas da companhia.

A estratégia, revelada pelo jornal Valor Econômico e confirmada pelo GLOBO, aumenta a abrangência da ajuda e reduz o espaço para questionamentos sobre uma eventual mudança de rumo na instituição, que buscava reduzir sua participação no financiamento de grandes empresas. Mas há o temor de que esse modelo crie entraves ao processo, inclusive no de socorro às companhias aéreas, que negociam com o banco de fomento há semanas.

O BNDES prefere a participação de outros agentes financeiros porque, assim, consegue diluir seu risco. De acordo com uma fonte do banco, a ideia é ajudar mais companhias sem elevar o volume de recursos públicos na ação.

Os executivos do BNDES acreditam ainda que um consórcio de instituições, muitas delas credoras das empresas em dificuldade, referendaria a estratégia, diminuindo críticas. O banco não quer escolher sozinho quem será salvo, o que poderia levar à acusação de repetir a política de “campeões nacionais” dos governos Lula e Dilma, criticada por economistas liberais como os da equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes.

Segundo fontes, bancos como Itaú, Bradesco, Santander e Banco do Brasil poderiam participar das operações.

Aéreas têm pressa

Além disso, como alguns mecanismos estudados resultarão em participação acionária no futuro, o BNDES quer evitar que o socorro leve a uma concentração de ações no seu balanço justamente quando tenta se desfazer de uma carteira bilionária de papéis. No caso da aviação, por exemplo, o BNDES se tornaria acionista relevante em todas companhias se entrasse sozinho.

Mas o BNDES não abre mão de instrumentos que se desdobrem em participação acionária. Segundo uma fonte, é essencial que o acionista da empresa socorrida também dê sua contribuição, sendo diluído. Procurado, o BNDES não quis se pronunciar.

Uma fonte do setor aéreo teme que a exigência de que outros agentes participem das operações atrase ainda mais o plano. Após queda de 90% na oferta de voos e o fim de praticamente todas as rotas internacionais, as aéreas vivem sua crise mais aguda. Têm pressa.

Gol e Latam reduziram salário e jornada dos tripulantes, com cortes que, na prática, encolhem em até 80% a remuneração, segundo o Sindicato Nacional dos Aeronautas. A Azul suspendeu o pagamento de aluguel de aviões e tem 10,5 mil dos 14 mil funcionários em licença não remunerada.

Na terça-feira, o conselho da Latam recomendou adiar o pagamento de dividendos. Já a Gol fez acordo com a Boeing em razão do aterramento dos 737-Max, com uma compensação em valor não divulgado, e cancelou 34 de 129 encomendas de aviões da fabricante.

“O indicativo que há hoje sobre quanto tempo poderiam operar sem ajuda é o caixa. Pelo nosso cálculo, seriam seis meses para a Azul e quatro para a Latam”, avalia Thaís Cascello, analista do Itaú BBA.

Apesar da situação dramática, as negociações com o BNDES estão travadas, segundo um executivo do setor aéreo. O principal entrave é a definição do preço de referência para as ações das companhias.

O BNDES exige que o parâmetro seja o valor atual, depreciado pela crise, enquanto empresários pressionam pelo patamar pré-crise. Isso vai definir a fatia que o banco terá na companhia no futuro.

“O BNDES quer ter uma dívida de mercado. Mas isso não é possível se não existe mercado neste momento”, disse outro executivo.

Segundo as fontes, a intransigência do BNDES se deve ao temor de processo no Tribunal de Contas da União (TCU), que, no passado, já questionou transações semelhantes. Uma saída seria trazer o TCU para a mesa de negociações, disse um dos envolvidos nas conversas.

Além disso, pode-se instituir uma cláusula do tipo earn out, comum em fusões, que posterga a fixação de preço a um momento que reflita melhor o valor da companhia.

Segundo John Rodgerson, presidente da Azul, não há proposta formal do BNDES. “O entendimento é ter um acordo que vai ser justo, que remunera o dinheiro que nos vai ser dado”, disse o executivo ontem, em uma live.

As aéreas, contudo, precisam urgentemente fortalecer o caixa para a retomada, diz Daniela Bretthauer, analista da Eleven Financial:

“A despesa delas é hoje uma folha reduzida. O empréstimo emergencial vai ser mais importante daqui a seis meses, porque será p reciso ter caixa para a retomada”.

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