Apesar da Lei Seca, que reduziu sensivelmente as mortes nas vias do DF, por dia, cerca de 60 condutores são flagrados sob efeito de álcool. De acordo com o Detran, entre janeiro e setembro de 2019, 17.518 motoristas foram autuados
Por dia, mais de 60 brasilienses são flagrados ao volante sob efeito de álcool. Dados do Departamento de Trânsito do Distrito Federal (Detran) mostram que ocorreram 17.518 autuações dessa natureza entre janeiro e setembro deste ano. Isso significa que quase 2 mil condutores são multados mensalmente por alcoolemia na capital. No domingo, agentes do órgão e policiais militares montaram uma blitz em Taguatinga e autuaram 41 condutores em apenas duas horas.
Em todo ano de 2018, o Detran registrou 21.469 infrações relativas à alcoolemia, uma média de aproximadamente 1,7 mil infrações mensais — ou seja, as pessoas continuam bebendo e dirigindo, assumindo riscos que podem provocar tragédias. Para o especialista em engenharia de transporte da Universidade de Brasília (UnB), Pastor Willy Gonzales Taco, os mecanismos que existem hoje para coibir esse tipo de direção perigosa, como a Lei Seca, são frágeis. “As pessoas ainda não compreendem as próprias responsabilidades. E isso não se resolver sozinho. Podemos fazer blitz em alguns lugares da cidade, mas essas infrações ainda vão continuar acontecendo”, destaca o professor.
O estudioso ressalta que há uma sensação de impunidade por parte dos motoristas brasilienses e que o quadro precisa ser mudado com campanhas educativas e mudança de cultura. “Vivemos uma grande vulnerabilidade. A população de Brasília é muito jovem e precisa ser alertada sobre as consequências de se dirigir sob efeito do álcool”, comenta. De acordo com ele, deve ser ensinado ainda na infância, dentro dos núcleos familiares, como a prática é perigosa. “Tanto as vítimas quanto os motoristas são afetados quando acontece um acidente”, alerta.
Gonzales Taco aponta que outro aspecto que deve ser observado pelos órgãos de trânsito é a corresponsabilidade dos bares e restaurantes com relação à bebida. “Poderia ser pensado algum tipo de programa, uma mobilização condicional, para que os estabelecimentos ofereçam serviços em que as pessoas não precisem usar o veículo”, explica. De acordo com o estudioso, sindicatos e federações à frente desse tipo de comércio poderiam agir junto aos órgãos de trânsito e entidades ligadas ao transporte para investir nesse tipo de atendimento, evitando infrações de alcoolemia.
De janeiro a junho deste ano, 147 pessoas morreram em acidentes de trânsito no Distrito Federal, segundo levantamento do Detran. Do total de vítimas, 67 (46%) apresentaram resultado positivo para uso de substâncias entorpecentes. Ao todo, 30 consumiram álcool, 22 drogas e 15 ambas as substâncias.
No ano passado, o número de pessoas mortas no trânsito da capital atingiu 280. Ao todo, 139 haviam ingerido algum entorpecente A análise constatou uso de álcool em 53 casos, de drogas em 49 e de ambas as substâncias em 37. A estatística do órgão ainda apontou que, das vítimas mortas, 13 eram pedestres, 34 condutores, nove motociclistas, três ciclistas e um passageiro.
Para o diretor de policiamento e fiscalização de trânsito do Detran, Francisco Saraiva, a atuação dos órgãos se intensificou, afetando as estatísticas. “Hoje, temos um serviço de inteligência, que observa dados estatísticos nos locais típicos de cometimento de infrações. A partir disso, podemos agir para inibir as práticas irregulares”, explica. De acordo com ele, falta efetivo para cobrir simultaneamente diversos pontos da capital, porém, a resposta em ações pontuais se mostra positiva.
“Sempre estamos presentes em grandes eventos. As pessoas que chegam, observam uma equipe de agentes e se sentem inibidas. Quanto mais fiscalização, menos infrações teremos”, reforça. De acordo com ele, durante os fins de semana, entre 14h e 20h, são os horários em que há mais incidência de alcoolemia. Sobre a Lei Seca, Saraiva ressalta que a medida foi de suma importância para reduzir as mortes.
O medo de provocar acidentes e de colocar a própria vida e a dos outros em risco, coloca a maioria dos brasilienses em alerta. O auxiliar administrativo Ygor Henrique Santos dos Reis, 23 anos, costuma sair para a balada, principalmente aos fins de semana. Morador de Ceilândia, ele vai a festas e bares no Plano Piloto. “Tenho carro, mas deixo em casa quando vou beber. Uso outras formas para ir embora, como motorista de transporte por aplicativo ou carona”, relata.
Para não dirigir sob efeito de álcool, Ygor e a namorada, a professora Lorena Farias Torres, 27, revezam o volante nas saídas. “Um bebe e o outro dirige. Porém, quando nós dois queremos curtir, a gente não sai de carro”, ressalta. De acordo com o auxiliar administrativo, o problema não é a multa elevada, mas sim as consequências. “Compensa mais pagar um transporte de aplicativo, por exemplo, do que correr o risco de morrer ou tirar a vida de alguém”, afirma.
Na tarde desta quarta-feira (16/10), a estudante Dayanna Santos, 23, foi encontrar o pai, o supervisor comercial Jadir José Ferreira, 44, em um bar da Asa Sul. Como ambos estavam dirigindo, deixaram a bebida de lado. “Hoje em dia, é inviável beber e dirigir. Moro na Asa Sul e quando saio para um lugar onde vou beber um chope, vou e volto com motoristas particulares”, reforça Jadir. De acordo com ele, a fiscalização e os riscos são suficientes para inibir a prática irregular.
Frequentadora de festas e de bares no Plano Piloto, Dayanna também opta por motoristas de transporte por aplicativos para sair de casa. “Uma vez estava dirigindo e um motociclista bêbado sofreu um acidente na minha frente. Só isso já serviu como aviso”, lembra. A estudante destaca que os motoristas devem ter consciência ao sair de casa e não ingerir álcool. “É uma irresponsabilidade”, comenta.
A operação, batizada de Último Gole, aconteceu próximo a um pesque-pague de Taguatinga. Durante a ação dos agentes de trânsito, 11 condutores foram flagrados inabilitados e 18 veículos precisaram ser recolhidos ao depósito do Detran. Além disso, um carro que furou a blitz teria sido roubado ou furtado e foi recuperado pelos policiais. Ao todo, 45 profissionais, 19 veículos, uma aeronave e cinco guinchos do órgão participaram da operação.
» O Código de Trânsito Brasileiro prevê que dirigir sob influência de álcool é considerado infração gravíssima. Quem for pego com níveis acima de 0,3 mg/litro pode ser preso, ter o veículo retido e a Carteira Nacional de Habilitação suspensa por um ano. A multa para os motoristas que cometerem a infração é de R$ 2.934,70. Em caso de reincidência em até 12 meses, a multa é dobrada e alcança o valor de R$ 5.869,40. Em 2019, a Lei nº 11.705, conhecida como Lei Seca, completou 11 anos.
2018: 21.469
2019: 17.518*
* Os dados de 2019 são de janeiro a setembro.
2018: 280
2019: 147*
* Os dados de 2019 são de janeiro a junho.
2018: 139
2019: 67*
*As informações de 2019 são de janeiro a junho.