Plano diretor foi uma necessidade definida com o Ministério Público para a liberação da concessão do parque por 35 anos
São Paulo — Academia ao ar livre, espaço de meditação, casa de festas e palco de shows são algumas das tantas funções do Parque do Ibirapuera, na zona sul da cidade de São Paulo. A realização dessas atividades deve, contudo, mudar em breve, com a aprovação de um plano diretor que vai delimitar as regras de uso e funcionamento do local.
Na quarta-feira, o jornal O Estado de S. Paulo esteve em uma reunião pública na qual foram apresentados os principais pontos da proposta da gestão Bruno Covas (PSDB) para o plano diretor – uma necessidade definida com o Ministério Público para a liberação da concessão do parque por 35 anos. As propostas serão publicadas na próxima semana para consulta pública na internet. Mesmo mantido, o plano deverá ser revisado em cinco anos.
Um dos objetivos é regular atividades de assessoria esportiva, grupos de ioga (e assemelhados), visitas guiadas e piqueniques privados (entre 30 e 70 pessoas), hoje realizados por empresas e organizações externas que costumam cobrar pelos serviços. A ideia é limitar as práticas aos dias úteis e em determinados pontos do parque, tudo mediante autorização.
Na reunião, técnicos da Prefeitura justificaram que a mudança garante a fluidez na área para os frequentadores e dá prioridade ao caráter público. Eles citaram como exemplos assessorias que ocupam áreas verdes com dezenas de alunos e eventos sociais privados (como piqueniques e até casamentos) que chegam a colocar faixas e seguranças para restringir o acesso de terceiros.
Hoje, dezenas de organizações e empresas realizam atividades no local, atraindo maior público especialmente aos sábados, domingos e feriados. “Ofereço aula todos os dias, mas muitas pessoas procuram no fim de semana. Vai afetar muita gente”, diz o professor de ioga Dado Motta, de 38 anos, que critica a limitação de agenda.
Já o personal trainer Vinícius Motinho, de 31 anos, sócio da LV Training, não poderá mais dar aulas abaixo da marquise do pavilhão da Bienal, se a mudança for aprovada. “Se chover, ali é coberto e dá uma segurada no vento. As pessoas gostam do ambiente aberto (para se exercitar). Ficam a semana inteira fechadas em escritório, em casa, aí gostam de ver o verde, de ter a presença da natureza. É um pedido delas.”
Eventos culturais
O plano também prevê regras para eventos culturais no parque. Nas áreas abertas, não poderão ser simultâneos e o público máximo é de 15 mil pessoas (no entorno do auditório), embora deva variar de acordo com o espaço (será de até 250 pessoas na Serraria, por exemplo). Em espaços abertos, no passado, shows como os de Gilberto Gil chegaram a trazer mais de 45 mil pessoas para o Ibirapuera.
Já a restrição de eventos fechados chega a 15 mil pessoas, no pavilhão da Bienal. Como exemplo, a Bienal do Grafite 2005 (no Pavilhão da Cultura Brasileira) atraiu 60 mil pessoas somente na abertura.
A proposta da administração municipal também é de restringir a área aos usos atuais (como alimentação, esporte e lazer). Dentro disso, está proibida a instalação de uma série de serviços e espaços, como teleférico, pedalinho, zoológico, tirolesa, parque de diversões e pista automobilística.
Embora seja apontado como uma das principais fontes de renda da futura concessionária, o estacionamento não poderá ser ampliado. O plano permite apenas o redesenho de vagas para otimizar o espaço atual. Um aumento da área impermeável também é vetado. Na reunião, o que foi ressaltado é que a legislação atual proíbe o corte de qualquer árvore e o paisagismo precisa ser preservado, pois é tombado, assim como as edificações projetadas por Oscar Niemeyer.
Na proposta está a manutenção e a reforma do Centro de Convivência e Cooperativa, bem como da escola de jardinagem. Além disso, aponta duas áreas que a concessionária deverá escolher para implementar um cachorródromo.
O Estado procurou a Prefeitura, que se manifestou apenas por uma nota. Ela não informou prazos para a aprovação do plano diretor ou para o início da concessão, que está em suspenso até a publicação da versão final do plano diretor.
Fauna e flora
Um levantamento da Prefeitura identificou 199 espécies de animais no Ibirapuera (que é ponto migratório) e na área do entorno, assim como 16 mil árvores. Nesse campo, o plano diretor prevê ações de monitoramento da fauna, recuperação da margem dos lagos, manutenção da cobertura vegetal e até de contenção do furto de aves (especialmente patos).
Isso inclui, por exemplo, uma mudança nas atuais fachadas do Museu Afro Brasil e do prédio da Bienal para coibir as colisões de pássaro (o que necessita de aprovação dos órgãos oficiais de patrimônio, pois são construções tombadas).
Além disso, o plano também prevê uma análise trimestral da qualidade da água dos lagos, o que é considerado insuficiente pela bióloga Assucena Tupiassu, que integra o conselho gestor do parque. “Sempre foi um problema o despejo de esgoto do córrego que abastece os lagos. O controle microbiológico é importantíssimo. Não pode ser a cada três meses de jeito nenhum.”
“Tem algumas espécies ameaçadas que estão no Ibirapuera, como o caboclinho e o pixoxó (aves). Tem algumas relíquias lá”, diz ela. “São nove espécies só de beija-flor. O Ibirapuera tem uma miscelânea de árvores nativas, de Cerrado, da Mata Atlântica, da Floresta Amazônica. Você acaba tendo um leque de alimento muito grande.”
Assucena defende, ainda, que ocorra regulação sobre o volume e a duração de shows no parque, principalmente pelo impacto na fauna. “Se tiver ambiente com muito ruído, estressa de qualquer maneira, não só os pássaros.”
Futuro concessionário
Em março, a empreiteira Construcap fez a maior oferta (R$ 70,5 milhões) para gerir o espaço e outros cinco parques do Município por 35 anos.
Em nota, a construtora informou que trabalhará em “estrita observância ao edital de licitação, às legislações em vigor, em especial a legislação ambiental, a preservação da fauna, da flora e da paisagem tombada pelo patrimônio histórico.”