Pacientes que testaram positivo para o novo coronavírus falam ao Correio sobre a experiência do isolamento social, os cuidados com a saúde e a importância de a população ficar em casa mesmo sem apresentar sintomas, como medida preventiva
Após a notícia de que a advogada Daniela Teixeira se recuperou da Covid-19, outros 191 pacientes em tratamento no Distrito Federal seguem na expectativa para, em breve, também poderem dizer que se curaram da doença causada pelo coronavírus. Até a tarde de ontem, 11 deles estavam internados em unidades de saúde. Os demais permanecem em casa, sob cuidados meticulosos e com a higienização do ambiente reforçada. Como o micro-organismo gera sintomas variados a depender do indivíduo, para quem testou positivo, a expectativa é de que a manifestação da doença não gere uma situação crítica.
No caso de Jhennifer Karoline Ferreira, 24 anos, o quadro da Covid-19 tem parecido mais leve com o tempo. Recepcionista em um hospital particular de Brasília, ela fez o exame que detecta a presença do vírus em 16 de março. Na data, ela apresentou sintomas como tosse, espirros e diarreia. O resultado saiu dois dias depois. Desde então, a jovem segue em quarentena em casa, no Gama, onde mora com o pai e o irmão. “Também tenho uma filha de 2 anos, mas, no dia em que fiz o teste, ela entrou em isolamento e foi para a casa do pai. Estamos esperando o resultado do teste dela”, contou.
Enquanto se recupera, Jhennifer segue uma regra principal: permanecer longe dos demais. Ela raramente deixa o próprio quarto e, quando isso acontece, sai apenas com máscara cirúrgica, para proteger os familiares. “Quando soube (do resultado), fiquei muito desesperada. Mas, com o passar do tempo, fui ficando mais tranquila. Ouvi relatos de pessoas que tiveram a doença e têm se recuperado bem. Eu também tenho. Estou tomando muita água, comendo mais frutas e verduras, higienizando sempre as mãos e evitando contato com os outros”, disse a jovem.
Até hoje, Jhennifer não tem certeza de como contraiu o vírus. Ela não esteve com pessoas que viajaram para fora do país recentemente e, no hospital, não ficou próxima de pessoas sintomáticas. O processo de isolamento não tem sido agradável. “Sou uma pessoa muito ansiosa. Está sendo difícil para mim, mas, infelizmente, é necessário. Como meu caso repercutiu muito nas redes sociais, recebi muitas mensagens boas, de gente desejando coisas positivas. Tenho lido esses recados e respondido, para amenizar um pouco minha ansiedade”, relatou. “É muito importante ficar em casa, pois, às vezes, as pessoas nem sabem que estão doentes”, frisou.
Esforço psicológico
Uma viagem recente para São Paulo pode ter levado o empresário Lucas Hamu, 27, a se contaminar com o novo coronavírus. Ele fez o teste na segunda-feira e recebeu o resultado positivo no dia seguinte. Os sintomas começaram em 18 de março, três dias depois de chegar a Brasília. “Tive febre baixa, que não passou de 37,8°C, e um pouco de dor nas pernas. Durou uma semana inteira. Na segunda-feira, acordei sem paladar e sem olfato. Perdi completamente. Quando fui pesquisar, vi que esses também eram sintomas (da Covid-19), principalmente em pessoas mais jovens e em casos mais leves”, detalhou o morador da Asa Sul.
Lucas recebeu uma ligação da Secretaria de Saúde e passou detalhes sobre como pode ter contraído o vírus. Hoje, ainda com um pouco de dor no corpo, o jovem conta que não sente mais febre. Em casa, onde mora com a mãe e o pai — diabético e com mais de 60 anos — todos os itens de uso pessoal ficam separados.
O empresário conta que a situação demanda mais esforço psicológico do que físico. “Para não perder a sanidade, vamos colocar assim, é preciso estabelecer uma rotina: quarentena não são férias. E, no meu caso, envolve trabalhar, ler bastante, ver filmes e estudar”, contou.
Lucas diz que, quando estava em São Paulo, o coronavírus parecia algo distante, apesar dos casos confirmados. No entanto, em cerca de cinco dias, a realidade mudou. “É (um vírus) extremamente contagioso e o momento é de ter empatia. Temos de ter cuidado e responsabilidade.” Durante o período de isolamento, ele permanece em observação, para o caso de os sinais se agravarem.
Mudança adiada
Não é possível precisar o dia em que o servidor público da Justiça do Trabalho Mateus*, 40, se contaminou com o coronavírus, mas foi há cerca de três semanas. Ele esteve em um jantar com um casal de amigas e, depois, descobriu que uma delas teve contato com um dos integrantes da comitiva que acompanhou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) aos Estados Unidos. A amiga de Mateus testou positivo para o coronavírus.
No início da semana seguinte, dores abdominais e febre alta denunciaram que algo estava errado. “Eu tinha uma consulta logo cedo com o otorrinolaringologista. Faço acompanhamento para tratar de uma apneia do sono, devido a alguns problemas respiratórios. Ao citar os sintomas para o médico, ele recomendou que eu fizesse o teste”, relatou Mateus.
Com o resultado em mãos, o servidor público passou a comunicar os contatos e precisou adiar a mudança. Por ser militante da causa LGBTQI+ e soropositivo há 10 anos, ele contou que receber o diagnóstico não foi tão difícil. “Já tive essa experiência de ter de contar para as pessoas sobre um vírus, então encarei de forma mais tranquila. Já vivi uma pandemia antes e estou fazendo o possível para vencer esta também”, afirmou.
Mateus completa os 14 dias de isolamento na segunda-feira. Mesmo assim, destacou que nem ele nem o restante da população pode abrir mão de ficar em casa. “Eu não vou sair por aí. Sou atleta, saudável e meu corpo tem reagido bem. Mas, mesmo depois de curado, se eu calçar um sapato, posso espalhar o vírus. Então, vou continuar em quarentena e isolamento, com o restante da cidade.”