Reunião de emergência entre negociadores do Reino Unido e da União Europeia discute saída para crise gerada por proposta de Boris Johnson
Representantes europeus e britânicos participam nesta quarta-feira (10) de uma reunião de emergência em Londres para discutir a nova crise envolvendo o Brexit, a saída do Reino Unido da União Europeia. O impasse surgiu depois que o governo do primeiro-ministro Boris Johnson apresentou, na quarta-feira, um projeto de lei que passa por cima de compromissos assumidos no acordo que oficializou o Brexit, em 31 de janeiro.
O vice-presidente da Comissão Europeia, Maros Sefcovic, vai se reunir com o ministro Michael Gove, o principal negociador do lado britânico. Sefcovic disse que convocou a reunião para que os britânicos “esclareçam e respondam às nossas grandes preocupações”. A União Europeia e o Reino Unido estão na oitava rodada de negociações para definir como serão as relações econômicas entre as duas partes depois que terminar o período de transição para o efetivo divórcio, em 31 de dezembro.
O risco de uma separação sem acordo cresceu depois que o governo britânico mostrou sua intenção de mexer num ponto delicado que já tinha sido discutido lá atrás: a situação alfandegária da Irlanda do Norte, que faz parte do Reino Unido. No texto original do Tratado de Retirada dos britânicos do bloco europeu, um protocolo garantia a ausência de uma fronteira física entre a Irlanda do Norte (que faz parte do Reino Unido) e a República da Irlanda, membro da União Europeia. O objetivo é evitar a volta de tensões nessa região, marcada por três décadas de conflitos até a assinatura de um acordo de paz, em 1998.
A alteração proposta pelo governo de Boris Johnson na quarta-feira significaria a instalação de uma fronteira física entre a Irlanda do Norte e a Irlanda. Segundo Johnson explicou na Câmara dos Comuns, o retorno do controle alfandegário na região teria o objetivo de proteger o país, uma vez que, nos termos atuais do acordo do Brexit, a Irlanda do Norte poderia ficar isolada do restante do Reino Unido.
A proposta de Johnson recebeu críticas até mesmo de conservadores britânicos. A ex-primeira-ministra Theresa May, antecessora de Johnson no cargo, disse que o atual primeiro-ministro cedeu a Bruxelas para conseguir um acordo rápido de saída. Agora, tenta voltar atrás. “Como pode esse governo assegurar aos seus futuros parceiros internacionais que podem contar com ele para cumprir as obrigações legais dos tratados que assina?”, questionou May.
Impacto do Brexit
A economia do Reino Unido é uma das que mais sofreram no mundo com os efeitos da pandemia do coronavírus. No segundo trimestre, o PIB britânico caiu 20,4% em relação ao trimestre anterior, o pior resultado desde 1955. A grave crise econômica leva muitos britânicos a defenderem a tese de que “pior do que está não fica” – e que, portanto, é um bom momento para acelerar a saída do país do bloco europeu. Um estudo do economista britânico Thomas Sampson, da London School of Economics (LSE), no entanto, adverte que, diferentemente da covid-19, o Brexit terá um efeito duradouro. Ele calcula que um Brexit sem acordo poderá custar para a economia britânica duas a três vezes mais do que a covid-19.
Sem um acordo, as relações comerciais britânicas com a União Europeia seriam regidas pelas regras da Organização Mundial do Comércio, o que significaria mais impostos alfandegários. Os consumidores britânicos pagariam preços mais altos nos supermercados, já que o Reino Unido importa grande parte de seus alimentos.
Boris Johnson tem afirmado que um rompimento abrupto com a União Europeia não seria ruim para o país, porque lhe daria “liberdade para fechar acordos comerciais com todos os países do mundo”. Não parece tão simples. Paralamente à negociação com a União Europeia, o Reino Unido busca fechar o mais rápido possível um acordo de livre-comércio com os Estados Unidos. Ontem, a presidente da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, Nancy Pelosi, divulgou uma nota afirmando que “não haverá absolutamente nenhuma chance” de um acordo comercial entre americanos e britânicos caso o Brexit coloque em risco o acordo de paz na Irlanda do Norte.