Dos cuidados das participantes de projeto social, nascem as petúnias, sálvias e dálias que embelezam os mais de 500 canteiros ornamentais da capital
O manuseio das plantas e o cheiro de natureza funcionam como uma terapia para ela. Aos 33 anos, a baiana R.G.S. cumpre pena no regime semiaberto e é uma das 50 reeducandas que trabalham no Viveiro I da Novacap, localizado no Park Way. As mãos cuidadosas da moça se ocupam do transporte de minúsculas mudas de sálvia-vermelha para um tabuleiro de plantio.
Ela chegou ao viveiro há pouco mais de dez dias e já está ambientada. Trabalha com afinco, visando à remissão da pena que, pelos seus cálculos, ainda dura 15 anos. “Estar aqui é gratificante. Nossas plantas estão espalhadas por Brasília toda. Vão para os balões, praças, fica tudo lindo. Sou orgulhosa disso aqui”, confessa. R. deixa a Penitenciária Feminina de segunda a sexta, planta, cultiva e, ao final do dia, retorna ao local para dormir.
Já C.M., 59, é a veterana da turma. São quatro anos de serviços prestados naquela imensidão de árvores, sementes e mudas. Mãe de quatro filhos e com dois netos, ela conta que tem como ‘filhas’ as mais variadas plantas. “Retorno do fim de semana já curiosa para saber se está tudo bem, se tem alguma morrendo”, relata. “Meu sonho é um dia abrir uma floricultura”.
As duas mulheres integram um projeto social da Novacap em parceria com a Fundação de Amparo ao Trabalhador Preso (Funap), órgão vinculado à Secretaria de Justiça e Cidadania (Sejus). O objetivo é gerar empregabilidade e perspectiva de vida para elas que vivem o dia a dia da ressocialização. A iniciativa começou em 2017, com 30 reeducandas.
Vagas para até 200 aprendizes
Atualmente, são 120 detentas atendidas e outras 80 estão sendo selecionadas pela Funap para o projeto. Além do Viveiro I da companhia, o de número II recebe os serviços de outras 70 moças. Do esforço delas, nascem as belas petúnias, sálvias e dálias que embelezam os mais de 500 canteiros ornamentais da capital. Mudas de ipês, arbustos, palmeiras, vasos ornamentais, entre outros, também saem dali.
As aprendizes recebem uma bolsa ressocialização no valor de R$ 978 e benefícios como vale-alimentação e transporte.
“A maioria dessas mulheres nunca trabalhou na vida. E a gente vê o quanto elas se sentem valorizadas aqui, de ter um ofício e contribuir para a nossa cidade”, ressalta a chefe da Divisão de Agronomia da companhia e responsável pelos dois viveiros do DF, Janaina Gonzales.
“E o serviço delas é fundamental, pois não temos mão de obra suficiente na Novacap para o tanto que produzimos”, explica.
Recomeço e esperança
Para a diretora adjunta de assuntos sociais e educacionais da Funap, Carla Miranda, a oportunidade de trabalhar “abre um leque de esperança” na vida dessas mulheres. “Faz toda a diferença, sem dúvida alguma. Depois de cumprida a pena, somente 5% delas voltam para o crime”, observa. “Muitas são arrimo de família, precisam ter renda. E, no viveiro, elas recebem essa grande oportunidade”.
Não há um prazo para que as reeducandas permaneçam ali, já que tudo passa pelo cumprimento da pena. Há, sim, a convicção delas de que é possível recomeçar tendo a natureza como grande aliada.