Nas ruas de Perdizes, na zona oeste de São Paulo, placas fixadas nas fachadas dos prédios lembram um drama recente na vida dos paulistanos: “Este condomínio utiliza água de reúso”. Quatro anos após o início da crise hídrica paulista, mudanças forçadas nos hábitos de consumo de água feitas por moradores que temiam ou sofreram o racionamento viraram o principal antídoto contra uma nova estiagem severa.
“O consumo era alto porque a gente gastava muita água lavando o jardim, o pátio e a garagem. Quando a crise começou, fizemos um sistema de captação de água da chuva com 14 mil litros de capacidade e diminuímos em 30% o gasto com água”, diz Reginaldo de Lima, de 60 anos, zelador de um condomínio com 40 apartamentos em Perdizes que montou sozinho uma estrutura para reaproveitar água pluvial nas áreas comuns do edifício.
Nos dois anos de crise hídrica, esse e outros métodos para reduzir o consumo – instalação de redutores de pressão em torneiras e chuveiros e de hidrômetros individuais, e abertura de poços artesianos – geraram um efeito permanente que poupou os mananciais e definiu um novo padrão de consumo de água.
Dados da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) mostram que, mesmo após dois anos do fim do racionamento, no início de 2016, o consumo na Região Metropolitana ainda é 15% menor do que era antes do início da seca que assolou o Cantareira, o maior manancial paulista, em fevereiro de 2014, quando a empresa lançou o programa de desconto na conta para quem reduzisse o gasto.
Hoje, a Sabesp produz 60,9 mil litros por segundo para atender 21 milhões de pessoas na Grande São Paulo. Há quatro anos, a demanda era de 71,4 mil l/s. O volume “poupado” – 10,5 mil l/s – seria o suficiente para abastecer 3 milhões de pessoas por dia ou encher quase duas represas Guarapiranga por ano, com 326 bilhões de litros. No auge da crise, em 2015, a produção caiu até 53,2 mil litros por segundo, com o racionamento que chegou a durar 15 horas por dia.
Indicador
Um outro indicador da Sabesp mostra que, de fato, um novo padrão de consumo de água se estabeleceu depois da crise. Isso porque o gasto médio per capita na Grande São Paulo em 2017 foi de 129 litros por habitante/dia, o mesmo índice de 2016, o primeiro pós-racionamento. Em 2013, antes da crise, esse índice era de 169 litros por habitante/dia, 31% maior.
“Durante a crise houve um posicionamento muito importante da população, que passou a consumir menos água e a ter hábitos diferentes. No pós-crise, essa economia continuou e os números mostram que houve uma mudança de hábito da população. É um legado da crise”, diz o secretário de Recursos Hídricos, Benedito Braga.
O prédio onde a aposentada Cleonice Lima Boiati, de 62 anos, é síndica, no Cambuci, zona sul, é um exemplo. Em 2014, ela promoveu uma ação caça-vazamento nos 36 apartamentos e nas áreas comuns e alterou o sistema de limpeza da piscina, o que fez consumo cair de 498 milhões de litros por mês para 286 milhões, queda de 42%. E os condôminos colhem até hoje o resultado financeiro da mudança. “Isso fez toda a diferença porque mesmo com esses aumentos todos que tiveram na conta de água a gente ainda paga menos do que há quatro anos.”