Especialista elenca alguns temas que causaram repercussão no último congresso europeu de cardiologia, um dos maiores do planeta
Não é novidade que as doenças cardiovasculares estão entre as principais causas de morte no mundo. Somente no Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde, cerca de 300 mil pessoas sofrem infartos anualmente e, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), até 2040 as mortes por doenças do coração devem ter um aumento de 250%. Diante desses dados, é cada vez mais decisivo estudarmos e discutirmos novas abordagens e tratamentos para os problemas cardiovasculares.
Especialistas de todo o planeta se reuniram entre os dias 31 de agosto e 4 de setembro em Paris para o ESC Congress 2019, o congresso europeu de cardiologia. Trata-se de um dos principais eventos da área, onde os profissionais podem se reunir para dialogar e conhecer estudos e descobertas que impactam o dia a dia dos pacientes.
A cardiologia preventiva, por exemplo, ocupou um grande espaço nas sessões do congresso, com alguns temas surpreendentes e muito esclarecedores. Podemos destacar um estudo alemão feito com 3 500 pessoas por 15 anos, que avaliou o impacto da qualidade do sono nos níveis de pressão arterial. A pesquisa comprovou que a pressão se altera muito quando não se dorme adequadamente, reforçando o papel do sono não só contra a hipertensão como na prevenção de males causados pela pressão alta, caso de infarto e acidente vascular encefálico.
Outro trabalho apresentado no evento salientou que, quanto melhor o nível educacional e sociocultural da população, menor a incidência dos eventos cardiovasculares. Isso traduz a necessidade do autocuidado. Quanto mais consciente a população é, mais autocuidado terá, e assim é possível melhorar a qualidade e a expectativa de vida, reduzindo a exposição aos problemas cardiovasculares.
Outro assunto debatido no ESC que chamou a atenção foi o aumento no número de infartos do miocárdio e o consumo exagerado de energéticos e drogas ilícitas. Uma xícara de café expresso, por exemplo, tem cerca de 60 miligramas de cafeína enquanto o energético chega a ter 600 miligramas. De acordo com um dos trabalhos apresentados ali (e segundo parecer da própria Anvisa), o consumo acima de 300 miligramas é prejudicial para o coração. Ao consumir energéticos, é prudente ficar uma hora sem praticar exercícios físicos, pois, nessas circunstâncias, eles aumentam o risco de se ter um evento agudo no coração.
Além de falar em prevenção, também é necessário abordar a recuperação de pacientes que já enfrentam as doenças cardiovasculares. E o evento sediado na capital francesa trouxe dois estudos indianos que demonstraram o papel da ioga nesse contexto. Os pesquisadores avaliaram durante um ano pacientes que sofreram infartos graves. Além da reabilitação cardiovascular convencional, o acréscimo da terapia com ioga apresentou resultados extremamente positivos.
Outra abordagem surpreendente é o fato de que, em um futuro próximo, doenças cardiovasculares poderão ser tratadas por meio de terapias gênicas, aquelas que manipulam os genes visando a um ganho para o paciente. Um experimento mostrou que, atuando numa enzima relacionada à síntese do DNA, é possível editar parte do código genético associado à maior propensão a uma doença cardíaca.
Essas e outras novidades apresentadas em Paris permitem aos cardiologistas conhecer a fundo os desafios da área e nos ajudam a pensar em caminhos para atender e tratar melhor as pessoas com doenças cardiovasculares.
* Dr. José Armando Mangione é médico e coordenador do Núcleo de Cardiologia da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo