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Comunidade quilombola recebe do Incra contrato de concessão de terras

Documento assinado pela presidente garante posse da área aos moradores. Quilombola de Salto de Pirapora mantém língua e tradições africanas.

O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) entrega nesta quinta-feira (26) o Contrato de Concessão de Direito Real de Uso (CCDRU) para a comunidade quilombola do Cafundó, localizada em Salto de Pirapora (SP). O documento garante posse do terreno aos moradores enquanto a decisão judicial definitiva sobre o território é aguardada.

Localizado a pouco mais de 100 quilômetros de São Paulo, o Cafundó ainda possui falantes de uma língua própria, a cupópia, variante linguística do bantu, mais uma das marcas de sua origem quilombola. As terras originárias da comunidade foram sendo cercadas, ameaçadas pela especulação imobiliária, tomadas por pastagens e até mesmo por um porto de extração de areia.

Representantes da comunidade estiveram no Palácio do Planalto, em Brasília (DF) durante a assinatura do documento pela presidente Dilma Rousseff no dia 19 de novembro. O processo de regularização foi iniciado com o relatório técnico e antropológico produzido pela Fundação Instituto de Terras de São Paulo (Itesp) em 1999 e teve continuidade com o Incra.

As 28 famílias da comunidade só conseguiram permanecer em suas terras por conta de uma ação de usucapião, movida por uma antiga liderança, Otávio Caetano, em 1972. Impedidos de exercer seus modos tradicionais de produção, os cafundoenses se viram relegados a precárias condições de vida e sujeitos à violência dos novos posseiros, situação que vem sendo revertida com as ações de regularização fundiária que vão permitir à comunidade assegurar seu território.

Presidente assina documento de concessão de terras para quilombola (Foto: Roberto Stuckert Filho/PR)
Dilma assina documento de concessão de terras para quilombola (Foto: Roberto Stuckert Filho/PR)

 

A regularização dessas terras vem trazendo segurança jurídica e a perspectiva de desenvolvimento para a comunidade, após décadas de lutas pelo reconhecimento de seus direitos. O CCDRU refere-se a duas áreas do quilombo: a área A, com 19,4 hectares e onde moram os quilombolas e área C, com 32,2 hectares. A maior área, a D, tem 122 hectares, foi desapropriada pelo Incra em 2012 e já é controlada pela comunidade. A área total do território, reconhecido em 2006, é de 218 hectares.

Em memória dos ancestrais
Com lágrimas escorrendo pelo rosto, Regina Aparecida Pereira, uma das líderes da comunidade, relembrou a luta de seus antepassados para a recuperação das terras. “Hoje lembro de cada um deles e vejo que não foi em vão. Demorou demais, mas hoje sabemos que valeu a pena e que pode haver um futuro diferente para nossa comunidade.”

Maria do Carmo dança e entoa cânticos religiosos africanos: tolerância entre crenças.  (Foto: Mayco Geretti/ G1)
Maria do Carmo dança e entoa cânticos religiosos:  tolerância entre crenças. (Foto: Mayco Geretti/ G1)

 

A luta dos quilombolas pela propriedade vem de 1972, quando a comunidade conseguiu garantir ao menos a área onde estavam instaladas as casas das famílias graças a uma ação de usucapião movida pelo ex-líder Otávio Caetano, que já morreu.

Regina Aparecida relembra que as terras da comunidade quilombola foram sendo perdidas para pessoas que se aproveitavam da simplicidade dos moradores do Cafundó. “Chegavam para nossos bisavôs e pediam que eles plantassem milho, dizendo que depois a safra seria comprada. Quando o milho estava pronto para o corte esses invasores cercavam a área e se apropriavam dela. Foram ações baseadas em documentos que continham apenas as impressões digitais de nosso antepassados que não sabiam ler. Eles cediam suas digitais como sinal de boa fé, como forma de firmar o contrato que, na cabeça deles, lhes renderia algum dinheiro.”

Segundo Regina, a meta principal para o futuro é investir na produção agrícola, tanto para subsistência quanto para comercialização. Até hoje, na área onde viviam as famílias, existiam apenas pequenas hortas. “Conforme perdemos terras o cultivo se tornou cada vez mais escasso. Sem condição de trabalhar na lavoura, os quilombolas começaram a procurar emprego na cidade. Nossa ideia é resgatar nossas origens e atrair os quilombolas de volta para cá, para que eles trabalhem no que é nosso.”

Moradora do quilombo Cafundó, que recebeu a posse da terra em Salto de Pirapora (Foto: Mayco Geretti/G1)
Moradora do quilombo Cafundó, que recebeu a posse da terra em Salto de Pirapora (Foto: Mayco Geretti/G1)
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