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Ação internacional dos atingidos de Mariana será reavaliada na Inglaterra

Tribunal de apelação de Londres reconsiderou decisão anterior e vai avaliar se atingidos pelo rompimento podem apelar e ter julgamento no Reino Unido

(crédito: Leandro Couri/EM/D.A.Press)

Uma última e rara cartada jurídica na Inglaterra trouxe de volta a esperança de que os atingidos pelo rompimento da Barragem do Fundão consigam justiça, após quase seis anos sem reparação no Brasil. A expectativa é de que até meados de julho, a Corte de Apelação em Londres decida se os atingidos poderão contestar a decisão de primeira instância que tirou do Reino Unido a competência para julgar as responsabilidades da tragédia (veja abaixo o histórico dessa ação).

Os advogados do escritório PGMBM que representam cerca de 200 mil atingidos no Reino Unido contra a empresa anglo-australiana BHP Billiton fizeram uma petição ao tribunal de apelação contra a negativa de recurso e acionaram o dispositivo legal 52:30, uma contingência do código civil para que grandes injustiças não sejam cometidas. Com isso, em decisão expedida nessa terça-feira (04/05), o pedido de apelação poderá ser novamente avaliado.

Ao lado da Vale, a BHP Billiton é controladora da Samarco, a mineradora responsável pelo rompimento que matou 19 pessoas e devastou a Bacia Hidrográfica do Rio Doce, entre Minas Gerais e Espírito Santo, em 2015. Desde 2018, o escritório que reúne advogados brasileiros e do Reino Unido tenta processar a multinacional que tem uma das sedes em Londres. Os valores indenizatórios podem chegar a 5 bilhões de libras (cerca de R$ 38 bilhões).

O escritório PGMBM foi procurado, mas preferiu não comentar ainda sobre essa petição e suas expectativas. Fontes jurídicas ouvidas pela reportagem indicaram que a manobra em si pode ser considerada uma grande vitória por ser extremamente raro a reavaliação de uma decisão na corte do Reino Unido, sobretudo por meio desse instrumento. O caso em si, se aceito, pode ser o que reúne o maior número de clientes do Reino Unido.

Os argumentos usados para isso foram técnicos, mas também pesou o desenrolar lento e cercado de suspeitas do caso no Brasil. O primeiro motivo foi que o juiz de apelação tomou sua decisão com base em documentos diversos aos apresentados pelos advogados dos atingidos. Em segundo lugar, há precedentes jurídicos da suprema corte do Reino Unido que foram ignorados, segundo a sustentação do escritório PGMBM.

Pesaram, ainda, três fatos considerados graves e em andamento no Brasil. Um deles é o pedido do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) para que a Fundação Renova, criada para a reparação das vítimas no Brasil seja extinta, uma vez que suas contas não são aprovadas pelo terceiro ano consecutivo e haja inúmeras denuncias de irregularidades e desvios, segundo os promotores.

Julgamento em primeira instância em Manchester não admitiu o processo dos atingidos no Reino Unido
Julgamento em primeira instância em Manchester não admitiu o processo dos atingidos no Reino Unido (foto: Mateus Parreiras/EM/D.A.Press)
Somado a isso, há ainda a cobrança do Ministério Público Federal (MPF) de que o juiz Mário de Paula, da 12ª Vara Federal de Belo Horizonte, seja considerado suspeito por homologar acordos vistos pelos procuradores de justiça como prejudiciais aos atingidos e benéficos às mineradoras, bem como o pedido de recuperação judicial da Samarco, que pode ter reflexos nas indenizações e reparações aos atingidos.

O juiz da Corte de Apelação em Londres recebeu a petição e, por se considerar suspeito, uma vez que a decisão de não receber o recurso foi dele próprio, distribuiu a requisição dos advogados ao vice-presidente da corte, que recebeu e intimou as partes para uma nova audiência, ainda a ser marcada.

Para as fontes ouvidas pela reportagem, essa é uma esperança tênue, em que a sustentação do caso deverá ser nítida e robusta para que o juiz decida primeiramente reconhecer que a análise do recurso poderá ser reaberta. Em seguida é que será decidido o mérito do recurso que defende que o processo de indenização seja acolhido pelas cortes do Reino Unido.

Advogados da BHP Billiton e dos atingidos terão cerca de 2 horas para suas sustentações orais, enquanto os seus argumentos legais por escrito serão analisados. Uma decisão, nesse caso, sairia dias depois.

A reportagem procurou a BHP Billiton e a 12ª vara Federal, mas ainda não obteve retorno.

Justiça no exterior – O desenrolar judicial dos atingidos no Reino Unido

5 de novembro de 2015

Barragem do Fundão, operada pela mineradora Samarco, em mariana, se rompe liberando 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro. Um contingente estimado em 700 mil pessoas é impactado na Bacia do Rio Doce. Dezenove morreram depois do rompimento, sendo que uma das vítimas não teve seu corpo recuperado até o momento.

21 de setembro de 2018

Sob risco de as ações de indenização prescreverem após três anos do desastre, o escritório inglês SPG Law, atualmente PGMBM, anunciou que ingressaria com ação em cortes do Reino Unido contra a BHP Billiton SPL, controladora da Samarco ao lado da Vale. Na época era estimado em 5 bilhões de libras.

3 de outubro de 2018

Acordo firmado entre o Ministério Público, a Samarco e suas controladoras (além da BHP, a Vale) previu a interrupção do prazo legal de prescrição.

2 de Novembro de 2018

O escritório PGMBM protocola na Justiça do Reino Unido os pedidos de indenização contra a BHP Billiton SPL representando mais de 200 mil atingidos pelo rompimento da barragem. Inicialmente o processo transcorreria na corte de Liverpool.

16 de novembro de 2018

Fundação Renova pressiona prefeituras e atingidos a desistir da ação internacional como condição para receber compensações acordadas. Advogados do escritório internacional reagem.

18 de dezembro de 2018

Justiça determina que Fundação Renova pague o valor indenizatório por gastos extras com os prejuízos do rompimento à Governador Valadares e em seguida uma série de outras decisões mantêm municípios na ação internacional.

2 de abril de 2019

BHP requer a transferência da ação de Liverpool para Londres. Depois de 15 dias, o juiz decide manter em Liverpool por ter sido escolhido como foro pelos advogados dos atingidos e por terem um escritório lá.

13 de março de 2020

A PGMBM apresenta à BHP um amplo conjunto de documentos sustentando que é legítima a intenção dos clientes de moverem uma ação perante a Justiça do Reino Unido. Há pareceres de juristas, depoimentos de vítimas e advogados brasileiros que atuaram no Brasil em favor dos atingidos e populações afetadas pelo rompimento da barragem de Fundão.

30 de Abril de 2020

Confirmação da data do julgamento.

O julgamento do processo contra a BHP Billiton tinha a previsão inicial de acontecer em junho deste ano, houve um pequeno adiamento por conta da pandemia de COVID-19 que está afetando o mundo todo. A nova data será no dia 20 de julho de 2020

22 a 31 de julho de 2020

Advogados dos atingidos e da BHP Billiton levam o caso internacional ao Centro de Justiça Cível em Manchester, onde o juiz sir mark Turner julga se as indenizações poderão ser processadas pelas cortes do Reino Unido.

9 de novembro de 2020

O juiz sir Mark Turner considera abusivo o pedido de indenização dos atingidos contra a empresa anglo-australiana BMP Billiton. Advogados das vítimas recorrem.

23 de março de 2021

A Corte de Apleação em Londres nega o recurso e extingue o caso. Advogados apontam que a decisão foi tomada fora dos argumentos apresentados, desconsidera precedentes e ainda traz risco de grave injustiça sobretudo por fatos em andamento no Brasil, como possível suspeição da Justiça Federal, pedidos do MP para extinção da Renova e recuperação judicial da Samarco.

04 de maio de 2021

Juiz da Corte de Apelação em Londres se julga suspeito e transfere petição ao vice-presidente da instituição, que reabre a análise em processo que deverá ser decidido em julho de 2021, com possível novo julgamento sobre recurso dos atingidos.

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