A frase, de um cardiologista, refere-se à denúncia feita pelo Hospital Albert Einstein de seus cardiologistas pela suspeita de favorecer empresa de próteses
O Hospital Albert Einstein, em São Paulo, um dos mais conceituados do país, denunciou à Polícia Civil na segunda-feira dois médicos do setor de cardiologiasob suspeita de receber pagamentos e favorecer uma empresa fornecedora de próteses cardíacas. De acordo com informações do jornal Folha de S. Paulo, os cardiologistas denunciados Marco Antonio Perin e Fábio Sandoli de Brito Júnior comandavam juntos, até junho, o Centro de Intervenção Cardiovascular do Einstein.
“Ao receber denúncia anônima de supostas inconformidades na área de cardiologia, e após apuração interna, a direção encaminhou a denúncia para autoridades policiais, a fim de proceder investigações e encaminhamento que se fizerem necessários no âmbito legal”, afirma nota divulgada pelo hospital.
A investigação interna da entidade analisou os e-mails corporativos e detectou repasses de dinheiro para contas de profissionais feitos por pessoas ligadas àCIC Cardiovascular, uma das fornecedoras supostamente envolvidas no esquema. A empresa fundada em 2012 que tem como sócia Fátima Martins, enfermeira do Einstein nos anos 80.
Os contatos entre médicos e pessoas ligadas a essa empresa ocorriam desde 2012 via repasse de recursos e de viagens e presentes. Em junho de 2015, por exemplo, Perin teria recebido da fornecedora pouco mais de 200.000 reais, e Brito Júnior, 100.000 reais. A investigação interna constatou um aumento de 541% na compra de stents farmacológicos nos anos de 2012 e 2013 e identificou uma “clara preferência” pelos produtos fornecidos pela CIC Cardiovascular.
Segundo a Folha de S. Paulo, o jornal teria recebido desde junho – época em que os nomes dos médicos foram retirados do expediente do hospital como chefes do centro – informações de leitores de supostas irregularidades em procedimentos cardíacos realizados no hospital.
O caso foi levado à polícia para que seja investigado se os médicos determinaram a realização de implantes desnecessários de próteses apenas para alavancar os lucros da fornecedora e receber comissões por isso. Até o momento não há nenhuma prova de que isso tenha ocorrido. Inclusive, uma auditoria interna realizada por amostragem em cirurgias cardíacas feitas por esses profissionais não detectou intervenções desnecessárias. Essa investigação também está apurando se houve a colocação de duas próteses quando apenas uma seria suficiente.
Segundo a representação do Einstein protocolada na polícia civil, o ex-gerente do Centro Intervenção Cardiovascular, Marco Antonio Perin, já tinha sido ouvido pela própria polícia em junho. Na época, ele apenas foi questionado se conhecia algum fato envolvendo esquema com fornecedores. Ao entrar em contato com a cúpula do hospital, o médico foi então informado sobre a investigação interna que detectara mensagens trocadas entre ele e representantes da empresa fornecedora.
Uma sindicância interna ainda está em andamento para apurar a participação de outros funcionários do hospital.
A resolução do caso pode demorar mais do que o esperado, porém. O delegado responsável disse a VEJA que pediu ao hospital documentos ad.
Antes de serem afastados, os médicos foram chamados para dar explicações à cúpula do hospital. Segundo relato de um integrante da investigação, ambos confirmaram o recebimento dos recursos, mas negaram irregularidade alegando que os repasses eram de um empréstimo deles com a fornecedora. Cada um desses profissionais recebia salário acima de 100.000 reais do hospital.
O Centro Cardiovascular do Einstein reúne tratamentos para doenças cardíacas e circulatórias por meio de cateterismo e os médicos denunciados estão entre os principais nomes da cardiologia do país. Entre as intervenções realizadas no centro estão a angioplastia e o implante de stent – que, pela tabela do SUS, custam a partir de 5.000 reais.
Até as 17 horas desta terça-feira, a direção do hospital não havia se manifestado sobre o tema.
Máfia
Um cardiologista ligado a dois grandes hospitais de São Paulo disse a VEJA que essa a “máfia das próteses” é comum em todas as especialidades, tanto no setor público quanto no privado. “Não são todos os médicos que fazem, mas afirmo que é bem comum e não só no Brasil”, afirmou.
“Não são os laboratórios que pagam os médicos e, sim, os distribuidores e, em muitos casos, os hospitais também estão envolvidos, pois todo mundo sai ganhando. Aqui no Brasil nunca vi procedimentos desnecessários sendo realizados. O que acontece é que o médico responsável pela cirurgia, a pessoa que escolhe qual prótese será utilizada, geralmente opta pela prótese mais cara, por meio da qual ele irá obter maior retorno”, diz.
Leia abaixo o comunicado do hospital:
“O Hospital Israelita Albert Einstein sempre prezou pela ética e transparência em todas as suas relações e sua direção segue rigorosos padrões de controle para assegurar que estes princípios sejam sempre respeitados.
Ao receber uma denúncia de uma possível inconformidade com estes princípios na área de Cardiologia Intervencionista, realizou uma apuração interna e adotou as medidas corretivas cabíveis.
Tendo em vista os limites naturais de uma apuração interna, o Hospital encaminhou a noticia do fato para as autoridades policiais, a fim de que procedessem as investigações que entendessem pertinentes.
As práticas médicas no Serviço de Cardiologia Intervencionista foram objeto de avaliação externa independente e estão dentro de padrões estabelecidos internacionalmente. No entanto, além das práticas médicas corretas, o Hospital exige e sempre exigirá, conduta ética irrepreensível de todos que estejam envolvidos na prestação de serviços em seu nome.”