Economista estima que quase 14,7 milhões – 7% da população – fiquem na extrema pobreza até o fim de 2020
Com a pandemia de coronavírus e seus efeitos econômicos, o Brasil caminha para voltar ao Mapa da Fome. É o que afirma o economista Daniel Balaban, chefe do escritório brasileiro do Programa Mundial de Alimentos (WFP, na sigla em inglês), a maior agência humanitária da ONU.
No Brasil, a estimativa é de que cerca de 5,4 milhões de pessoas – a população da Noruega – passem para a extrema pobreza em razão da pandemia. O total chegaria a quase 14,7 milhões até o fim de 2020, ou 7% da população, segundo estudos do Banco Mundial.
“O Brasil saiu do Mapa da Fome em 2014, mas está caminhando a passos largos para voltar”, disse ele, em entrevista ao Estadão. Só entram no mapa países com mais de 5% da população em pobreza extrema, levando em conta anos anteriores.
Como vê o cenário da pandemia hoje no Brasil?
Vemos com muita preocupação no Brasil e ao redor do mundo também. O Programa Mundial de Alimentos é a maior agência de ajuda humanitária das Nações Unidas e está na linha de frente do combate à fome. Temos hoje em torno de 821 milhões em situação de insegurança alimentar, mas há 135 milhões que realmente passam fome. São pessoas que estão não só em situação de insegurança, mas não tem o que comer.
E quais serão os impactos dessa pandemia para a fome e a insegurança alimentar?
Avaliamos que, nos próximos anos, em torno de 130 milhões se juntarão a esses 135 milhões, formando 265 milhões. Vai dobrar o número de pessoas com fome crônica no mundo. Os países têm de se unir rapidamente para tentar evitar que esse número aumente.
Como está o Brasil nesse contexto?
A situação não é diferente. O País está hoje com um número muito de alto pessoas em extrema pobreza, que ganham menos de US$ 1,90 por dia. São 9,3 milhões, segundo dados de 2018. A estimativa agora é que, por conta dos efeitos econômicos, mais 5,4 milhões deverão entrar na extrema pobreza, segundo o Banco Mundial. O Brasil saiu do Mapa da Fome em 2014. Agora, está caminhando a passos largos para voltar.
De que forma a atual gestão da pandemia poderia reduzir esse impacto?
O grande drama que vejo é que não há uma unicidade, um comando que lidere o Brasil como um todo para sair desta pandemia. De uma forma que haja menos mortes e menos infectados. Cada Estado toma suas próprias decisões, os municípios também estão tomando. O governo federal tem uma linha difusa, não sabe se apoia ou não a Organização Mundial da Saúde (OMS), se apoia a quarentena ou não. Isso fica muito complicado.
Como corrigir isso?
É preciso uma forte liderança nacional. Os sinais passados são difíceis de entender e de acompanhar. Quem está falando o certo? E, ao mesmo tempo, somos bombardeados no Brasil o tempo inteiro com informações falsas. É preciso identificar, multar e prender quem faz isso. O papel do Estado é fazer chegar alimentos e recursos financeiros para que essas famílias se mantenham. O Estado tem de ser capaz de ajudar a população em um momento como esse, totalmente emergencial. Requer medidas diferenciadas. As medidas do Congresso e do governo federal, de fornecer auxílio de R$ 600, não resolve, mas ameniza o problema.
Que bons exemplos o senhor vê ocorrendo ao redor do Brasil?
Pernambuco fez uma orientação muito forte com relação à covid-19. O Maranhão conseguiu trazer os respiradores. O Ceará é extremamente atingido, mas tem reagido bem. O Rio Grande do Norte também. Quanto menor o Estado, quanto mais organizado, mais fácil de fazer com que as orientações sejam seguidas. Por isso, acredito que deveríamos ter uma orientação centralizada.
Faz falta neste momento um conselho como era o Conselho Nacional de Segurança Alimentar, que foi extinto em 2019?
Foi extremamente importante. Muitas políticas concebidas a partir do início do século 21 foram aperfeiçoadas através desse conselho. O governo não é obrigado a seguir, se não concordar. O Brasil criou o Consea e hoje vários países do mundo têm conselhos criados com base nele.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.