Paris deve ser a pior cidade do mundo para o viajante econômico. E quando eu digo econômico, leia pobre. Aquele mochileiro que resolve que vai conhecer a Europa custe o que custar, desde que esse custo seja quase zero. Para esse viajante, os preços parisienses e a dificuldade para achar hospedagem barata assustam, claro, mas sabe o que é pior? As vitrines de Paris.
Veja bem, não estou falando das vitrines das lojas famosas, cheias de roupas caríssimas ou eletrônicos de última linha. Claro que não. Um viajante econômico não se importa com essas vitrines, afinal ele já saiu de casa sabendo que aquilo ali é inalcançável, o tipo de lugar que ele não vai passar nem perto.
A verdadeira tentação das vitrines parisienses é para o estômago. É um desafio e tanto para o viajante pobre, digo, econômico, não comprar todas as delícias que restaurantes, lojas e padarias parisienses exibem ao cliente. Tudo ali na porta, exposto de forma quase imoral – como assim essa pouca vergonha toda não é proibida por lei?
Na minha primeira passagem por Paris, em 2011, gastei alguns euros que não poderia gastar com doces que não poderia deixar de comer. Os euros fizeram falta, mas a comilança logo acabou com o medo do rombo no orçamento. Em 2013 não foi diferente – saímos de Paris com um gostinho de quero mais. Quero que o mundo acabe assim, ó:
O que leva ao melhor conselho que alguém pode te dar sobre Paris: vai visitar a cidade e não tem dinheiro para torrar? Nunca, mas nunca mesmo, perambule pelas ruas da cidade luz com fome. Sentiu que está chegando a hora de comer? Comece a procurar um lugar que caiba no bolso antes da fome chegar. Caso contrário, bom, prepare-se para enfrentar o rombo no orçamento. A parte boa é que seu estômago não vai reclamar – e ele é muito mais importante que o bolso, né?
Esse conselho, inclusive, nem é meu, mas do escritor norte-americano Ernest Hemingway, que morou em Paris quando ainda era um jovem jornalista. E quando eu digo jovem jornalista, leia pobre. Olha o que o Hemingway diz no livro “Paris é uma Festa”:
“Se você não se alimentava bem em Paris, tinha sempre uma fome danada, pois todas as padarias exibiam coisas maravilhosas em suas vitrines e muitas pessoas comiam ao ar livre, em mesas na calçada, de modo que por toda a parte via comida ou sentia o seu cheiro”.
Hemingway viveu em Paris durante a década de 1920, num pequeno apartamento do Quartier Latin. Os quase cem anos mudaram muita coisa na cidade, mas não tiraram a tentação das vitrines. Se, assim como o Hemingway, você tem pouco dinheiro para gastar em Paris, siga o conselho dele:
“O melhor que tem a fazer é passear nos Jardins de Luxemburgo, onde não via nem cheirava comida, desde a Place de l’Observatoire até a rue de Vaugirard. Poderá sempre entrar no Musée du Luxembourg, onde todos os quadros ficam mais vivos, mais claros e mais belos quando se está com a barriga vazia, roído de fome. Aprendi a compreender Cézanne muito melhor, a entender realmente como é que pintava suas paisagens quando estava faminto.”
Ok, a dica do Hemingway é meio, err, extrema. Mas, a não ser que você também ache que a fome liberta seus sentimentos mais artísticos, há uma parte dessa dica que deve ser levada a sério: o Jardim de Luxemburgo. Ou o das Tulherias. Ou qualquer um dos quase 400 parques e áreas verdes de Paris, qualquer praça, qualquer banquinho de frente para o Rio Sena – Paris é uma cidade que clama por um piquenique. É muito comum encontrar as áreas públicas da cidade sempre lotadas de gente. Uma galera que leva suas comidinhas, seu livro e aprecia o que a cidade tem de melhor.
Quando estiver em Paris, faça como os parisienses. A capital da França não é local para ceder ao fastfood, seja pela falta de dinheiro para encarar restaurantes ou pela falta de tempo, algo tão comum durante o apertado roteiro de quem conhece a Europa pela primeira vez.
A saída mais econômica (e agradável) é escolher uma vitrine, encher o carrinho do supermercado, sentar-se num local aberto e agradável e curtir a cidade. Você vai gostar. O fantasma faminto de Hemingway, por outro lado, pode não ficar muito feliz de ver tanta comilança nos parques da cidade. Azar o dele.
Com o estômago cheio, aproveite para apreciar as outras vitrines de Paris – as que não têm comida. Em cada ruela, num local turístico ou não, você vai achar um lugar interessante, uma lojinha ou barraca de rua cheia de livros, pinturas ou lembrancinhas. Em Paris é assim: até a loja mais pega turista de todas, uma daquelas que só vende cartão-postal e presente para agradar gringo, tem um charme especial.
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