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Remédio para asma é associado a surtos psicóticos em crianças

Autoridades australianas lançaram o alerta em relação ao princípio ativo montelucaste de sódio. Especialistas afirmaram, porém, que o risco é baixo

Entre 2000 e 2016 a agência australiana responsável pela regulação de medicamentos recebeu quase 90 relatos de efeitos colaterais neuropsiquiátricos, dos quais oito estavam relacionados a pensamentos suicidas e outros oito a depressão grave em crianças que tomavam algum medicamento com esse princípio ativo. Nos EUA, houve um caso de suicídio em 2008. (iStock/Getty Images)
Entre 2000 e 2016 a agência australiana responsável pela regulação de medicamentos recebeu quase 90 relatos de efeitos colaterais neuropsiquiátricos, dos quais oito estavam relacionados a pensamentos suicidas e outros oito a depressão grave em crianças que tomavam algum medicamento com esse princípio ativo. Nos EUA, houve um caso de suicídio em 2008. (iStock/Getty Images)

Uma classe de medicamentos para asma tem preocupado autoridades de saúde australianas. Ela estaria associada a episódios de depressão e até pensamentos suicidas em crianças. Tratam-se dos remédios à base de montelucaste de sódio, um composto comum utilizado para tratamento de rinite, asma e dermatite atópica, principalmente em crianças e adolescentes.

Segundo informações da rede australiana ABC, a agência australiana responsável pela regulação de medicamentos, dispositivos médicos, sangue e tecidos, (TGA, na sigla em inglês), recebeu, entre 2000 e 2016, quase 90 relatos de efeitos colaterais neuropsiquiátricos, dos quais oito estavam relacionados a pensamentos suicidas e outros oito a depressão grave em crianças que tomavam algum medicamento com esse princípio ativo.

A australiana Melanie (que não quis revelar seu sobrenome), contou que Harrison, seu filho de 6 anos, teve um surto psicótico após começar o tratamento com o medicamento. Segundo a mãe, o menino sempre foi amigável e afetuoso, mas começou a ter ataques de raiva, chegando a derrubar móveis, ranger os dentes e contorcer a face, após iniciar o tratamento.

“Eu estava incrivelmente chocada quando percebi que uma pequena pastilha para controlar os sintomas da asma poderia ser vinculado a tais sintomas psicológicos graves.”, disse Melanie à ABC.

Segundo José Carlos Perini, alergista e presidente da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai), não há razão para desespero. Apesar do risco ser real, esse tipo de efeito adverso é raríssimo. Os efeitos colaterais mais comuns a esse medicamento são sonolência e dor de cabeça. No entanto, é preciso estar ciente e, caso perceba-se uma mudança de comportamento na criança, o ideal é buscar orientação médica. “No Brasil não há relatos de casos tão graves”, disse Perini a VEJA.

Para Joaquim Carlos Rodrigues, professor da Faculdade de Medicina da USP (Fmusp) e pneumo-pediatra do Hospital Israelita Albert Einstein, o alto número de prescrições do montelucaste de sódio por pediatras é devido ao fato de o medicamento ser  de fácil administração em crianças. “O método mais eficiente contra a asma é a ‘bombinha’, mas muitos pais têm aversão a ela, o que melhora a adesão ao montelucaste e acaba aumentado o número de prescrições”, explicou a VEJA.

Um levantamento realizado pela FDA, agência americana responsável pela regulação de medicamentos e alimentos, identificou cerca de 15.000 efeitos adversos associados ao uso de montelucaste em crianças e adolescentes. Destes, 10% estavam associados a problemas psiquiátricos. Sendo os mais comuns insônia, irritabilidade, hiperatividade e agressividade e outros mais graves como alucinações, depressão, ansiedade e comportamento suicida, menos frequentes.

Vanessa Sellick, australiana que também tem um filho chamado Harrison, conta que a criança mudou de comportamento após começar o tratamento quando tinha apenas dois anos de idade, e que os problemas se agravaram conforme ele foi crescendo. “Ele tinha 4 anos quando começou a fazer comentários sobre querer morrer, querer estar morto, dizendo que ele era um pedaço de lixo – ele tinha uma terrível auto-aversão”, contou a mãe.

A situação chegou a tal ponto que, um dia, ele tentou se suicidar. “Foi apenas devastador no momento. Para mim não há dúvida que ele realmente queria acabar com sua vida, ele queria acabar com a dor. Eu acho que ele era apenas um rapaz pequeno em um terrível stress emocional.”, contou Vanessa. Harrison tomou o montelucaste de sódio por três anos.

Embora na época não tenha havido um diagnóstico, os médicos acreditam que tudo isso tenha sido uma reação adversa à medicação. Segundo o pediatra especializado em respiração Adam Jaffe, do Hospital Infantil de Sydney, na Austrália, não há como saber quais pacientes apresentarão esse tipo de reação à medicação.

“Alguns dos meus pacientes reclamaram de pesadelos, mau humor, raiva ou tristeza e o grande desafio para mim e para os pais era descobrir se isso era um efeito colateral do remédio ou o comportamento da criança,” explicou à ABC, ressaltando que a maioria dos pacientes não apresente nenhum sintoma.

Anvisa

No Brasil, de acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, atualmente existem 24 medicamentos com o princípio ativo montelucaste de sódio no Brasil. A bula desses medicamentos alerta para a possibilidade de efeitos colaterais severos, como alterações de comportamento e humor (agitação, inclusive comportamento agressivo ou hostilidade, depressão, desorientação, distúrbio de atenção, anormalidades no sonho, ansiedade, alucinações, insônia, irritabilidade, perda de memória, inquietação, sonambulismo, pensamentos e atos suicidas e tremor). Mesmo assim, as autoridades australianas lançaram o alerta, frente ao relato das mães.

 

A FDA (na sigla em inglês), agência americana responsável pela regulação de alimentos e medicamentos, tem investigado a segurança do montelucaste de sódio desde a morte de um menino de 15 anos, em 2008, segundo a ABC. Cody Miller se suicidou 17 dias depois de começar a tomar o medicamento. Depois disso, a FDA passou a exigir que os fabricantes alertassem na bula sobre possíveis efeitos colaterais psiquiátricos do remédio.

Em abril de 2013, a TGA publicou um artigo alertando profissionais de saúde sobre esses riscos associados ao medicamento e a importância de alertar pais e pacientes. Entretanto, tanto Vanessa quanto Melanie afirmaram que não receberam nenhum tipo de aviso dos médicos.

Apesar do que aconteceu com seus filhos, ambas ressaltam a eficácia do medicamento no controle da asma e pedem que os pais não parem de dar o remédio a seus filhos sem consultar um médico. Por outro lado, elas clamam por avisos mais claros na bula desses medicamentos sobre a existência de tais efeitos colaterais e também pela importância do médico informar essa possibilidade aos pais.

O tratamento é indicado para casos de asma frequente, persistente ou induzida por exercício leve.

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